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A História Do Cabelo Afro E A Estética Que Incomoda

Publicado em 17/04/2021 - 14:15 Por Jeremias Brasileiro
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Créditos da imagem: Mn. Januário Garcia, 2006.

Todo quase dia Brasil afora surge uma polêmica, um ato preconceituoso, reações raivosas contra pessoas negras, principalmente jovens, que fazem usos de cabelos afros, ou Black Power. Existe, entretanto, uma correlação histórica entre um subconsciente de sinhá arraigado na sociedade brasileira que aparece nessas horas querendo determinar os lugares das pessoas e de como devem se comportar com seus penteados afros.

 

Se em tempos escravistas as mulheres, sobretudo que trabalhava na casa grande, eram obrigadas a esconder seus cabelos sob panos, não por uma questão de higiene, mas por estética, que seus “despenteados ruins” afrontavam o sonho belo das senhoras que almejavam ser parecidas com estética parisiense, nos tempos pós abolição essa tentativa de invisibilizar os penteados afros continuaram, pois as mulheres negras continuavam como domésticas nas residências das famílias brancas originárias também do período de escravização.

 

A obrigação de se alisar cabelos, ultrapassa essa etapa e continua por todos os lugares, quando na década de 1920, surge na Jamaica o orgulho pelo Black, o cabelo afro como sinônimo de identidade, de resistência, de ancestralidade, rompendo com a estética padrão imposta por uma cultura europeia e colonizadora. Também vai aparecer logo a seguir com os americanos fazendo uso do Black Power nas lutas pelos direitos civis nas décadas de 1950 e 1960 e esses usos como símbolos de afirmação, autoestima vivenciam o ciclo histórico com certo fim na década de 1980.

 

Retoma, portanto, em vários países com artistas de diversas matizes no inicio do século XXI, juntamente com um acirramento do racismo nos EUA e igualmente no Brasil. Uma nova geração começa a fazer uso de vários estilos de penteados afros, tal qual em sociedades africanas, em que o estilo é um modo de ser: viúva usa um tipo de cabelo, casada outro tipo, solteira outro tipo, ou seja, para cada situação vivida, a possibilidade de se expressar por meio do cabelo.

 

Os amplos significados dos penteados afros são desconhecidos no Brasil e por isso incomodam sobremaneira determinados setores sociais que ainda acreditam estarem vivendo na casa grande, do alpendre a decidir qual é o “lugar dos outros”, não por acaso a expressão “você sabe com quem está falando” é corriqueira no país. Os jovens com seus cabelos afros passam a ter uma tomada de consciência e ao sair do “lugar” terminam por incomodar com essa estética própria que desafia os padrões sociais instituídos por aqueles que sonham viver em Paris.

Tags: black power, história, afirmação, identidade
 Jeremias Brasileiro Jeremias Brasileiro
Crônicas e Ensaios das Gerais

Doutor em História Social pela Universidade federal de Uberlândia. É Comandante Geral da Festa da Congada da cidade de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, desde o ano de 2005 e presidente da Irmandade do Reinado do Rosário de Rio Paranaíba, Alto Paranaíba, Minas Gerais, desde o ano de 2011. Desenvolve pesquisas sobre cultura afro-brasileira e sua diversidade nas Congadas de Minas Gerais, associando-as com o contexto educacional, em uma perspectiva epistemológica congadeira, de ancestralidade africana. Um intelectual afro-brasileiro reconhecido na obra de Eduardo de Oliveira: Quem é quem na negritude Brasileira (Ministério da Justiça, 1998), que lista biografias de 500 personalidades negras no Brasil; e na obra de Nei Lopes: Dicionário Literário afro-brasileiro (Rio de Janeiro: Editora Pallas, 2011). Detentor de um dos maiores acervos digitais sobre as Congadas de Minas Gerais, constituído desde a década de 1980, historiador com vasta experiência e produção cientifica sobre ritualidades, simbologias, coexistências culturais e religiosas em oposição ao conceito de sincretismo. Escritor, poeta, possui textos de dramaturgia, crônicas, literatura afro-brasileira.

Leia também: Sincretismo não! Coexistência cultural e religiosa, sim. Parte 1