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Atravessar A Pinguela Do Santa Mônica Para O Tibery

Publicado em 03/04/2021 - 15:08 Por Jeremias Brasileiro
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Créditos da imagem: Foto: Reprodução/TV Anhanguera

Foi nos tempos sim, do Sô Leônidas, que chuva não molhava dançador do lado dele, que marimbondos avoava nos outros grupos, teve até um caso muito conhecido do povo da época, ali onde hoje é a Monsenhor Eduardo (avenida no Bairro Brasil), que lá vinha vindo um pessoal, e Leônidas irritado, mandou nuvem de marimbondo em cima deles. 

Várias versões permeiam as narrativas a respeito de Leônidas Costa, no caso emblemático dessa oraleitura, uns diziam existir somente pinga, outros acrescem a vela acessa e os mais próximos de Leônidas à época, ainda vivos, afirmavam que também havia um frango numa cuia de cabaça.

Os capitães de moçambique eram danados, ninguém zoava deles não, a resposta era na língua do congo antigo, hoje esses meninos, não sabem de nada, não dão conta das coisas lá de trás, por isso apelam é pra brigar dando bastonadas nos outros, uma guerra de bastão, não sabem nem pra que serve um bastão.

A PINGUELA TÁ FECHADA, QUEM É QUE VAI PASSAR? O rei Perpétuo, José Rodrigues, antigo dançador do Congo Sainha, presenciou muitas coisas, e relata sob a perspectiva de seu olhar memorial, uma demanda que teria acontecido em uma das andanças do grupo de Congado ao tentar atravessar uma pinguela, que dava acesso ao bairro Tibery.

Na chegança da travessia alguém vistou do outro lado da pinguela, onde hoje é avenida, mas era brejo naquele tempo, então alguém vistou uma garrafa de pinga, tinha uma vela acessa, tinha sim que eu vi, mas daí os dançador ficou naquela né, tudo parado sem coragem de atravessar a pinguela, até Zé Rafael ficou assim tipo acoitado, os da frente então parou de tocar e tudo ficou mudo, um paradão danado, causa de que naqueles tempos, as caixas era de couro, então aquela pinga do outro lado, segurou nóis tudo ali do lado de cá no Santa Mônica.

Então no meio de nóis tinha um benzedor né, não vou dizer nome dele, pode ser perigoso nessas horas, vai que a gente acorda ele, e ele volta assim danado pra mode amarrar quem dança ainda, que ele já morreu, ihhhh, faiz muito tempo viuuu! Mais daí ele apressou o passo, pisou na pinguela com todo cuidado, assim como quem conta passo de andar cuidadoso, e daí ele chegou lá no lado do bairro Tibery.

Nóis tudo do lado de cá na espera do acontecido, daí ele pegou a garrafa de pinga, deu uma bicada só, depois olhou pros lados, avistou um frango farofado, então ele foi lá, pegou o frango, deu mais uma bicada no gargalho assim da garrafa de pinga, mordiscou um pedaço de frango, deu uma risada boa e adepois gritou com a gente do lado de cá no Santa Mônica: - Uai! Cês não vai atravessá não? A pinguela tá aberta, ocês pode então passá.

A bandeira que era a guia não queria atravessar, tinha gente receada de não conseguir o feito, mesmo a pinguela sem aquela amarração de está fechada, daí um olhava pro outro, e ninguém se aventurava atravessar, teve uns que achou melhor ficar do lado de cá no Santa Mônica. Dizem que congadeiro é um cordão, mas naquela hora, no aperto das coisas, os nós do cordão desamarrou.

O capitão do lado de lá gritou então segunda vez: - uai, ocês não vai vim não? A pinguela tá aberta, todo mundo pode passá! Mais tem sempre um boca-dura, e esse gritou do lado de cá no Santa Mônica: - se nós passar na pinguela, tem de beber a pinga daí com você? Do outro lado o capitão sabido retrucou: - quem quiser bebe, que não quiser cai. Daí, no lado do Tibery, tinha gente com roupa limpa, tinha gente com roupa suja, suja de barro porque preferiu atravessar no brejo, de medo não da pinguela, mas da pinga que esperava do outro lado.

Tags: Festa, medo, curiosidades, congadas
 Jeremias Brasileiro Jeremias Brasileiro
Crônicas e Ensaios das Gerais

Doutor em História Social pela Universidade federal de Uberlândia. É Comandante Geral da Festa da Congada da cidade de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, desde o ano de 2005 e presidente da Irmandade do Reinado do Rosário de Rio Paranaíba, Alto Paranaíba, Minas Gerais, desde o ano de 2011. Desenvolve pesquisas sobre cultura afro-brasileira e sua diversidade nas Congadas de Minas Gerais, associando-as com o contexto educacional, em uma perspectiva epistemológica congadeira, de ancestralidade africana. Um intelectual afro-brasileiro reconhecido na obra de Eduardo de Oliveira: Quem é quem na negritude Brasileira (Ministério da Justiça, 1998), que lista biografias de 500 personalidades negras no Brasil; e na obra de Nei Lopes: Dicionário Literário afro-brasileiro (Rio de Janeiro: Editora Pallas, 2011). Detentor de um dos maiores acervos digitais sobre as Congadas de Minas Gerais, constituído desde a década de 1980, historiador com vasta experiência e produção cientifica sobre ritualidades, simbologias, coexistências culturais e religiosas em oposição ao conceito de sincretismo. Escritor, poeta, possui textos de dramaturgia, crônicas, literatura afro-brasileira.

Leia também: Sincretismo não! Coexistência cultural e religiosa, sim. Parte 1