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Itapecerica De Minas: A Tradição Das Gerais

Publicado em 19/10/2020 - 16:40 Por Jeremias Brasileiro
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Créditos da imagem: Zé Mineiro e o Berrante no Reinado do Rosário de Itapecerica. Acervo Digital Jeremias Brasileiro

Agosto é tempo de festas e nada de mês dos cães doidos. Para a criançada e adolescentes, Agosto simboliza: mês dos ventos, momento propício para empinar pipas ou papagaios. Agosto é o mês do folclore para uns, culturas populares para outros e tradições para tantos.


Que o diga a cidade de Montes Claros, localizada no Norte de Minas com seus Catopés de Congadas e Itapecerica, Centro Oeste de Minas com seus Reinados de Congos antigos. Por isso Agosto pra muita gente não é mês do desgosto e sim de muito gosto, eu mesmo sou fruto nascido no mês de Agosto. 

Importa que é tempo de festas e de histórias das quais Itapecerica é uma das referências em Minas Gerais. A velha Tamanduá que foi palco de uma revolta escrava capaz de atemorizar os senhores de engenhos e fazendas em 13 de maio de 1883, revolta violenta que naturalmente desapareceu com o advento da chamada abolição em 13 de maio de 1833. 

A rebelião de Carrancas – escravizados que lutam contra seus senhores e fogem – não poderia ser historicamente monumentalizada por se tratar de negros a protagonizar por meio inclusive da violência os seus status de liberdades, por isso foi oportuna a datação de 13 de maio como sendo a da libertação dos escravos por meio de uma benesse do Estado a desconsiderar essas anterioridades de lutas dos escravizados. 

Itapecerica é igualmente a terra de minha prima, mais conhecida como Maria Doceira, usa seus saberes para produzir artesanalmente vários tipos de licores e doces a partir dos frutos que o Cerrado gentil ainda oferta à região. E assim Maria Doceira, seduzida pela natureza das coisas, ao utilizar rapadura, faz doce de laranja da terra com um gosto diferenciado do açúcar comum. Uma produção artesanal incrível a partir do embu, abacaxi, limão, canela, laranja, pêssego e a mangaba fruto também originário da região. 

Doces em calda de laranja serra d’água, tangerina, limão capeta – mais conhecido como laranjinha e limão comum, mamão ralado, mamão enroladinho, figo, cidra. Doces com rapadura como: mamão, laranja, goiaba, além de abóbora com coco, jiló em calda, tomate em calda, pau do mamão, picles, licores e frutas cristalizadas. Maria doceira é a mestra dos saberes dessa região e seus produtos são também exportados, solicitados em outros países e em vários Estados do Brasil. 

Por isso reafirmamos sempre que Minas Gerais não é singular, Minas Gerais são vários plurais. E Itapecerica tem suas singularidades, importância histórica, cultural e tradicional que vai das lutas de escravizados em busca de liberdade, à presença de um reinado de Rosário com mais de duzentos e cinquenta anos realizando seus festejos, um patrimônio vivo com festivais diversos. 

Há sabedorias nesses lugares que atravessam gerações. Por entre montanhas e cerrados, por entre serras e vales, existem histórias que precisam ser contadas, narrativas vivas que eram desconhecidas por ausências de olhares mais atentos e preocupados com esses lugares, esses personagens que habitam o interior de Minas Gerais. Uma riqueza imensa que essas Crônicas e Ensaios das Gerais pretendem socializar com leitores mundo afora.

Doces e licores produzidos por Maria Doceira (Maria Perpétua). Acervo: Jeremias Brasileiro



Tags: Itapecerica, minas , tradições
 Jeremias Brasileiro Jeremias Brasileiro
Crônicas e Ensaios das Gerais

Doutor em História Social pela Universidade federal de Uberlândia. É Comandante Geral da Festa da Congada da cidade de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, desde o ano de 2005 e presidente da Irmandade do Reinado do Rosário de Rio Paranaíba, Alto Paranaíba, Minas Gerais, desde o ano de 2011. Desenvolve pesquisas sobre cultura afro-brasileira e sua diversidade nas Congadas de Minas Gerais, associando-as com o contexto educacional, em uma perspectiva epistemológica congadeira, de ancestralidade africana. Um intelectual afro-brasileiro reconhecido na obra de Eduardo de Oliveira: Quem é quem na negritude Brasileira (Ministério da Justiça, 1998), que lista biografias de 500 personalidades negras no Brasil; e na obra de Nei Lopes: Dicionário Literário afro-brasileiro (Rio de Janeiro: Editora Pallas, 2011). Detentor de um dos maiores acervos digitais sobre as Congadas de Minas Gerais, constituído desde a década de 1980, historiador com vasta experiência e produção cientifica sobre ritualidades, simbologias, coexistências culturais e religiosas em oposição ao conceito de sincretismo. Escritor, poeta, possui textos de dramaturgia, crônicas, literatura afro-brasileira.

Leia também: Sincretismo não! Coexistência cultural e religiosa, sim. Parte 1