Jovens Mulheres Congadeiras De Goiás: Vivências Na Tradição
Publicado em 13/03/2021 - 12:29 Por Jeremias BrasileiroConfesso inicialmente sentir-me lisonjeado, honrado, com o convite para participar de uma LIVE cujo tema são as mulheres na manifestação cultural e religiosa nas Congadas de Goiás, mais especificamente com presença de Goiânia e Catalão. Minha surpresa maior ainda por se tratar de uma juventude interessada em debater essa cultura, de se mostrar ao mundo enquanto participe da tradição ocupando funções diversas, capitãs, dançantes, guardiãs de grupos.
A luta dessas mulheres para se fazer visíveis nos rituais enquanto protagonistas, vem de longe, mas é preciso entender que elas já existiam, não é novidade do século XXI. O que ocorre é uma maior visibilidade devido às novas tecnologias, contudo, em muitos grupos, as mulheres, e mais notadamente as jovens, têm tido uma participação para além do senso comum de suas atribuições: cozinheiras, bordadeiras, costureiras. Essa LIVE com certeza abordará as funções ritualísticas e culturais, de como as jovens fazem sobretudo em Catalão e Goiânia para estarem enquanto congadeiras nos diversos grupos.
Na década de 1950, eram os homens denominados de "alferes" os condutores das bandeiras dos grupos de Congado; como era também nas Folias de Reis; noutro instante, entre as décadas de 1950 a 1960, tais funções passam a ser atribuídas às mulheres que ao instituírem os estandartes com sete ou doze fitas, faz com que surja ao mesmo tempo, a necessidade de que para estar a conduzir tais fitas, as jovens mulheres fossem virgens.
O tempo, no entanto, é descontinuo, a identidade congadeira (o) é do mesmo modo influenciada por essa descontinuidade. Com a morte de uma geração, muitos elementos e comportamentos apreendidos e ritualizados, sofrem modificações. Foi-se o tempo em que era possível nomenclaturar esse elemento simbólico como sendo representação feminina, uma vez que exclusivamente, as meninas eram as portadoras das diversas fitas que ornamentavam os estandartes. A presença cada vez mais significativa na modernidade, de outros personagens a portar as fitas do estandarte, de certo modo faz com que a interpretação do mesmo e igualmente sua denominação não seja cristalizada.
Entre os diversos atores inseridos na composição desse artefato, já figuram ativamente os congadeiros (as) que se identificam esteticamente como homossexuais, lésbicas, transexuais, a reconfigurar o imaginário da tradição, destituindo preconceitos e ao mesmo tempo instituindo quebras radicais de paradigmas. Se as mudanças são inevitáveis, novas identidades ao mesmo tempo são urdidas e com essas transformações, a ocorrer de modo acelerado na modernidade. As transformações, contudo, seja em qual época for, provocam tais reações e muitas outras formas de sensações.
Essas mulheres são na realidade, as lideranças jovens, adultas, cinquentenárias, centenárias, octogenárias, que enfrentaram e enfrentam há gerações, as batalhas cotidianas contra todo tipo de preconceito, de abuso, de opressão, para sobreviverem e chegarem ao século XXI, vivendo a tradição que impulsiona essa cultura com um viés contemporâneo, que às vezes aponta para mudanças estruturais significativas.