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Ódio a mulher

Publicado em 15/07/2022 - 16:05 Por Dra. Gabriela Lein Vieira
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Créditos da imagem: Internet

  

  Absurdo e atrocidade, é o que mais próximo  define a vulnerabilidade da mulher, no Brasil em 2022. Tenho notícias, de um misto de angústia e desespero no peito, resultando em horror.  O mundo está ao contrário mas dessa vez, aposto (por um ângulo sensato) que todo mundo reparou.


 A foto acima é de 2017,  estudantes de medicina, vestindo jalecos e com as calças abaixadas, fazendo gesto com as mãos representando a genitália feminina. Isso só reafirma, uma  certeza: o problema é estrutural, antigo e desumano, para com as mulheres. Degradante, chegando a invalidar a existência feminina, perante seus direito básicos!


 Recentemente dois casos tiveram repercussão nacional, duas mulheres, uma criança e uma jovem, foram vítimas de estupro. Ressaltando que há lei que embase elas, se optassem por aborto. Porém, ao contrário foram expostas, julgadas e desprotegidas. Por um júri hipócrita social, em nome da “moral”, as atacaram como assassinas e desalmadas. 


 O que sobra para essas mulheres? Não podem usar o respaldo da lei, para abortar. Eleger a adoção, é " abominável". Mas um estuprador violentar uma gestante, na sala de parto, só é denunciado por outra mulher. Qual o motivo disso? Tenho certeza que esse último, teve auxílio em "vista grossa" de outras pessoas. 


 Você leitor esperto, percebeu que independentemente da escolha dessas vítimas, o ódio é á mulher? É sobre isso que estou escrevendo!  


 Sobre quando uma mulher, que demonstra indícios em ser desejante, com autonomia sobre seu corpo e escolhas, ela é apedrejada e odiada. Há uma crença social arcaica, que uma mulher se limita a maternidade incondicional. Que o seu corpo e sua vida, estará submetido a um “homem” com “instinto”.


 Chegamos ao principal ponto, o que assusta, é a mulher que se inventa a partir da falta e sustenta o seu lugar de desejo na vida, com o direito que sabe que tem de vivê-lo.


Tudo que escrevi até aqui, passa também pela minha história. Vou contar!


 Fui advertida disso tudo, desse patriarcado existente. Mesmo assim, escolhi a medicina, lugar não confortável para mulheres, sustentando meu desejo, por gostar de gente.


 Elegi a psiquiatria, por identificação com um lugar de desproteção, salva por uma pulsão insondável de vida e indissolúvel de mim.


 No meu encontro com a psicanálise, achei a teoria para a clínica que eu já praticava. A da ética, respeito e comprometimento com o sujeito que escuto. 


 O meu juramento, é e sempre será, com o meu paciente! Vendo as últimas notícias, de um estuprador, que tem uma formação acadêmica médica, me horrorizo. Mas não me assusto!


 Na faculdade de medicina, vi os piores profissionais, que eu tinha certeza que não queria me tornar! 


 Dermatologista, que dizia que o paciente não precisa falar. Pois a pele fala por si! Pediatra, que orientava o quanto as mães atrapalham a consulta, pois acham “que conhecem seus filhos” mais que a medicina. Ginecologista, me orientar como aluna, um toque na gestante, com sabão. Pois a vaselina estava muito longe, em outra sala. Esse dia, eu me neguei e disse ao professor, para usar o sabão no próximo exame proctológico que ele fosse se submeter. Peguei a vaselina! 


 Nos meus primeiros anos de formada, no interior de Minas, vi mais um enxurrada de absurdos! 


 Diretor de pronto socorro, médico mandar eu transferir paciente grave para outro município, sem poder acompanhá-lo. Me neguei, também pedi demissão! 


 Vi médico tirar a cadeira do consultório, em pronto socorro, pois se o paciente não senta, não se demora. 


 Em todos esses casos que citei, eram homens! Homens e médicos! Esses que cito, psiquicamente existem de um lugar fálico e egoísta, não enxergam o outro. Empatia, existe apenas com o próprio umbigo. Quando esse outro, é uma mulher, o delírio de superioridade fortalece. Sabe aquele "negócio" de dívida histórica? Pois bem, com as mulheres parece que tá longe de acabar! 


 Assédio moral, não consigo contar nos dedos, os que passei. Sempre por homens, colegas de trabalho. Mas tá tudo bem, né? Homem é assim mesmo, são mais imaturos. E ás vezes, eu quem não soube o momento certo em falar com aquele meu chefe, o dia que o interrompi durante o décimo café, para chamá-lo em uma sutura, de uma criança com Síndrome de Down. Ele, do alto da arrogância, lembrou que meu jaleco parecia uma lingerie. Sim, isso tudo é um absurdo sem tamanho. 


 Primeiro pela deturpação egoica de “professores” que ensinam na faculdade de medicina, muitas vezes, a desrespeitar o sujeito por uma posição sem escuta. Segundo, por esse machismo estrutural, ao qual estamos apascentados. 


 Sou mulher, médica, mãe de duas meninas, solteira, inteligente, bem afeiçoada e com um lugar de escuta fino, para o outro em mim. Já pensou, que belo combo para eu ir para fogueira em outras épocas? 


 Sei na pele e na rotina o que é lidar com machismo e ser silenciada. Sei como em um divórcio, a mulher fica sobrecarregada! Porém, também se atrapalham menos. Pois quando o filho da sogra, vai embora, a tampa da privada ficará baixada e haverá um a menos pra você cuidar.


 O problema é bem mais embaixo,  na concepção machista de homens e mulheres, que a segunda deve servir a esse. Na criação e transmissão de “reizinhos” que o umbigo deles será o centro do universo.  Pois bem, o óbvio deve ser dito. 


 Uma mulher não é só mãe. Uma mulher se inventa. Uma mulher deseja e por esse deve circular, ao seu próprio modo de movimento por suas partes. Ninguém pode ser silenciada! Não sei se é decepção ou tristeza? Mas sei que o mundo está do avesso. A medicina precisa de uma reestruturação e as mulheres de coragem para se posicionarem.


Termino aqui, mas sigo gritando ao mundo, silenciar perante a injustiça, é apoiar o agressor! 

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Dra. Gabriela Lein

Gabriela Lein é médica atuante em psiquiatria, saúde de família e emergência. Atravessada pela psicanálise, há uma década atua em setor privado e público, realizando um exímio trabalho de investimento no indivíduo como cerne da vida. Visto esse modo atuante singular e impactante, promove saúde por onde passa, em âmbito nacional e internacional. Divulga seus questionamentos e inspira em suas redes sociais tanto no instagram quanto podcast, com base no conhecimento que tem do sofrimento humano real. Por aqui, semanalmente, acompanhem ela questionando o mundo em voz alta.

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