É preciso aprender a olhar
Publicado em 05/10/2021 - 10:31 Por Márcia Costa“Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas,
que estão diante de cada janela, uns dizem que
essas coisas não existem,
outros que só existem diante das minhas janelas,
e outros,
finalmente, que é preciso aprender a olhar, para
poder vê-las assim” (Cecília Meireles)
Começo essa nossa primeira conversa com o chamado de Cecília Meireles para que a gente aprenda a olhar. Apurar a vista pra se deliciar da existência, para se embriagar da vida todos os dias. Gosto demais de observar as cenas dos dias e de registrá-las pela lente da câmera fotográfica ou pelo celular. E você, tem olhado bastante o mundo?
Há quem pense que as grandes fotografias são resultado de grandes temas – um acontecimento marcante, um flagrante raro. Mas boas imagens são resultado de uma vista treinada, de um olhar lento principalmente para as coisas pequenas (desimportantes, como diria o poeta Manoel de Barros). Assim, se você pensa que as imagens que produz não têm valor, talvez precise olhá-las com mais apuro. Experimente deixá-las de molho em uma gaveta e, tempo depois, poderá descobrir ali, no mínimo, o registro, a marca de um momento precioso.
Aquela foto que você fez da sua avó na roça, ou do balançar do mato em um fim de tarde são imagens de significado porque dizem do seu olhar, do mundo que você vive, das coisas que compõem a sua existência – e elas podem também alcançar novas vistas, novos campos e sensibilizar outras pessoas. E essa possibilidade de conexão que a imagem produz entre nós cria elos que a gente nem imagina. Funda novos mundos entre nós.
Fotografia pode ser arte, pode ser memória, pode ser identidade, pode ser expressão. Eu penso que ela é tudo isso e muito mais. As imagens são uma janela para o mundo. A gente fotografa com todos os livros que leu, os lugares onde fomos, as pessoas com quem conversamos, como ensina Sebastião Salgado.
Fotografar é tentar capturar o mundo. Podemos clicar a mesma cena, mas cada imagem vai trazer rastros de uma trajetória, o recorte de um olhar. Eis a singularidade presente em um processo tão tecnológico. É essa possibilidade de interpretações diversas do mundo, das pessoas, que faz a fotografia ser tão instigante. E tem coisa mais bacana que trocar olhares?
(Captei as imagens acima em um fim de tarde, a bordo de um ônibus para Maringá)
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